O Jogo

A ideia e o poder de mudar mentalidad­es

- Luís Freitas Lobo luisflobo@planetadof­utebol.com

1Está cada vez mais distante no tempo, mas quem viveu esses anos 80 não esquece o impacto que teve na mudança de ciclo do futebol português. Quando chegou, Eriksson trouxe uma nova ideia e forma de encarar o jogo (e o treino) que, ligada a uma renovação de mentalidad­e, provocou uma revolução futebolíst­ica a todos os níveis. Estávamos em 1982. Mais do que grandes mudanças táticas, trazia uma filosofia de futebol sem amarras que soltava o talento dos jogadores, muito inspirado, como disse ao chegar, no que era a mentalidad­e inglesa do Liverpool desse tempo, definindo como triângulo do bom futebol, a velocidade, força e mente. O Benfica que montou logo a seguir (e foi finalista da Taça UEFA de 83) tinha tudo isso. Ao mesmo tempo, no Porto, a ideia de Pedroto, com a escola do nosso futebol de técnica de pé para pé mas metida noutra revolução, a fundação da revolta do caráter portista, caminhava também para o auge. A técnica que, disse Eriksson, não se atreveria vir ensinar aos jogadores portuguese­s porque nisso, fabulosos, eles já a dominavam na perfeição.

2Ainda hoje penso como seria rico para o debate do nosso futebol se Eriksson e Pedroto tivessem coexistido mais tempo, competindo e debatendo o jogo. Só conviveram uma época, 82/83 (quando Pedroto, já prevendo esse duelo aceso, falou após empatar na Luz no tal “rapaz alto e loiro”, era Manniche, para quem aquele Benfica metia tantas bolas na área). O “Mestre” partiria, porém, pouco depois (já não estaria, corroído pela doença, no banco na final da Taça das Taças de 84). Agora que Eriksson revela, já retirado, estar a disputar esse mesmo jogo além futebol, o jogo da vida, recordar estes tempos é perceber verdadeira­mente o que é o futebol e como preciosos podem ser os homens e as suas ideias para o mudar, do campo à mentalidad­e. Só os eleitos o conseguem e a sua influência (memória e legado) perduram no tempo. Como precisávam­os hoje de homens destes. Avançados no tempo. Até hoje.

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Quarenta anos depois, quando vejo equipas ditas mais pequenas (fora do círculo dos grandes) a querer jogar um futebol proativo com bola, assumindo correr riscos (tantas vezes excessivos) com isso, revejo como tudo começou a mudar a partir daí. Mudança lenta que correspond­eu, depois, ao nascer de novas gerações de futebolist­as, não com mais técnica, mas com outra, maior, mentalidad­e competitiv­a, sem complexos de inferiorid­ade que sempre tolhiam as equipas que, nesses velhos tempos, defrontava­m os grandes (e os nossos grandes internacio­nalmente). Eram raras as exceções de “se queres ser como os grandes, joga como eles”. Para isso, era preciso criar uma nova tipologia de jogador português (para além, claro, da evolução de estruturas e métodos de treino). Tudo começou assim na história moderna do nosso futebol.

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Eriksson chegou ao Benfica e apresentou uma nova ideia e forma de encarar o jogo
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