DAVID JUSTINO
Entretanto, identificam-se alguns dos grandes desafios que se colocam à educação em geral.
1. A ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO SOCIAL E CULTURAL da população escolar. O aumento dos fluxos de imigração projeta na escola uma diversidade de perfis como nunca foi observado em Portugal. Nem o Ministério da Educação, nem a maior parte das escolas, terão encontrado as melhores soluções para lidar com esta vaga crescente de filhos de imigrantes de primeira e segunda geração. A todos é necessário proporcionar igualdade de acesso ao conhecimento escolar, mas para que tal se concretize é necessário encontrar vias diferenciadas. Temos de apostar no princípio da unicidade curricular associada a diferenciação pedagógica. Teremos de ser rígidos no currículo comum e flexíveis nas práticas pedagógicas ajustadas aos diferentes perfis sociais e culturais.
2. OS CONTRIBUTOS DAS NEUROCIÊNCIAS E DA PSICOLOGIA cognitiva para se ajustarem às práticas pedagógicas, especialmente as que promovem as literacias de base. Torna-se imperioso reformular a formação inicial de educadores e professores consagrando nos seus curricula os adquiridos do conhecimento que esse domínio científico tem aportado.
3. AS TECNOLOGIAS DIGITAIS MOBILIZADAS para qualificar os processos de ensino e aprendizagem. Teremos de superar a dicotomia rejeição e adoção acrítica que predominam nas escolas. As tecnologias digitais são instrumentos quando mobilizadas de forma planeada e orientada para promover a qualidade do ensino apresentam resultados interessantes. Pelo que importa desenvolver uma pedagogia do digital que ultrapasse o seu menosprezo ou a sua utilização indiscriminada.
4. O PAPEL DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO e cultural na formação das novas gerações. Não há competência sem conhecimento prévio, especialmente o legado pelas gerações anteriores de que a escola assumirá o papel de transmissora. Saber pensar, saber questionar, saber (re)criar são competências que exigem esse domínio prévio do conhecimento. Por isso defendo um currículo assente no conhecimento e com abertura para o consequente desenvolvimento de competências. Inverter a ordem é iludir o papel do ensino e da escola e criar novas gerações de ignorantes.
5. A EDUCAÇÃO DE INFÂNCIA. Tradicionalmente votada à sua função de guarda e de limitado desenvolvimento recreativo, a educação de infância impõe a necessidade de articular a creche com a jardim de infância numa visão integrada dos primeiros cinco anos de vida das crianças. Na situação atual reparte-se a tutela deste importante ciclo entre o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e o Ministério da Educação, com políticas sem qualquer coerência ou intencionalidade social. Responsabilizar o Ministério da Educação pela conceção de uma visão integrada para a educação de infância é o primeiro passo para estruturar as políticas públicas de educação para este particular domínio, tão decisivo para o desenvolvimento humano das nossas crianças. Paralelamente, importa alargar a rede solidária e privada de forma a satisfazer a procura deste serviço. De pouco vale assegurar a gratuitidade se não existir oferta suficiente, especialmente nas duas grandes áreas metropolitanas.
NÃO TEREI ESGOTADO a identificação dos problemas nem a formulação das soluções, mas entendo que qualquer governo terá de trabalhar em simultâneo os três problemas identificados e os cinco desafios prioritários. O governante, seja ele quem for, que se centre numa estratégia coerente e não se deixe toldar pelo ruído constante de que vai ser alvo. Quanto mais atender ao ruído menor a probabilidade de concretizar a sua estratégia, acabando sempre por sair de lá queimado ou chamuscado por este fogo fátuo que cega sem se ver.
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