Diário de Notícias

Diversão em modo Jackie Chan

O cinema de Paul Feig voltou ao seu registo natural: a comédia de ação. Em Jackpot!, a química nasce entre Awkwafina e John Cena numa Los Angeles enlouqueci­da pela Grande Lotaria. Uma estreia Prime Video.

- TEXTO INÊS N. LOURENÇO

Em boa hora surge um filme que está menos preocupado com as grandes sensibilid­ades culturais do nosso tempo do que com o propósito de resgatar uma certa ideia de slapstick (comédia física). Numa altura em que o humor no ecrã parece estudado ao pormenor para não ofender o espectador em circunstân­cia alguma, Jackpot! vem dizer que ainda temos direito a um cinema respeitáve­l de piada sem decoro e ação sem freio, com coreografi­as de luta que, parecendo intermináv­eis, são mais do que cenas de pancadaria sem propósito – são uma forma de criar laços de confiança. Por outras palavras: o americano Paul Feig assinou aqui o seu “filme Jackie Chan” e convidou Awkwafina e o lutador profission­al John Cena para formarem a dupla mais estranha e simpática que nos poderia passar pela cabeça.

Jackpot! ambienta-se num futuro próximo, 2030, em Los Angeles, quando a criação do “Dia da Lotaria” deu origem a um fenómeno distópico: decretou-se na Califórnia que para reclamar o prémio multimilio­nário dentro dos termos da lei tem de se matar o vencedor antes do pôr do sol, sendo apenas proibido o uso de armas de fogo... Sem estar minimament­e a par desta novidade, uma jovem chamada Katie Kim muda-se para Los Angeles, na esperança de ir além da carreira de atriz infantil de outrora, e de um momento para o outro vê-se transforma­da no alvo de uma multidão violenta que recebeu um alerta dando-a como vencedora. O que fazer quando não há alternativ­a? Aceitar a ajuda de um hábil agente de proteção, que entra em cena ainda antes de a rapariga conseguir perceber o que se está a passar...

Com uma primeira metade que explora essencialm­ente a fuga e as inventivas coreografi­as de defesa em diferentes cenários, Jackpot! passa no teste da diversão relevante quando os seus dois atores se sentam para conversar numa sala de pânico decorada com temática de gatinhos. Aí, o filme de Paul Feig troca uma espécie de “dimensão John Wick sem armas” pela química olhos nos olhos entre Awkwafina e Cena, que se tornam um par cómico bem sintonizad­o, e sem necessidad­e de fator romântico – a não ser que soe romântico ela dar como razão para confiar nele o facto de ver na sua cara a expressão de “um buldogue que o feitiço de uma bruxa transformo­u em humano contra a sua vontade” (não é o que nos lembramos também quando olhamos para John Cena?).

Este é o bom território Paul Feig. O realizador que nos deu Spy (2015), com uma delirante interpreta­ção de Melissa McCarthy, volta a essa nota segura de comédia de ação que tem definido os seus principais trabalhos, sempre com elencos femininos e nenhum problema em subtrair feminilida­de à execução. Um estilo de comédia ágil, sobretudo física, que se destaca, não por ser particular­mente inteligent­e, mas por ousar uma liberdade rara, e até um humor infantil que é refrescant­emente incorreto.

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Awkwafina e John Cena juntos são de fiar.

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