O mercado encarrega-se de corrigir o Alojamento Local
Em 2013, as dormidas anuais do Alojamento Local (AL) estavam nos 3,6 milhões em Portugal e em 2019 já batiam os 10,2 milhões. O crescimento foi notável e o resultado levou à descaracterização de ruas inteiras do centro de Lisboa, os litorais algarvio e alentejano ficaram ainda mais pressionados com o número de apartamentos e moradias que se tornaram teto de curta duração para turistas, em detrimento da habitação permanente dos locais.
Apesar das evidências estatísticas do INE, esta subida sem controlo de casas disponíveis para AL demorou bastante tempo a fazer soar os alarmes do governo e das autarquias, que acabaram tarde por criar áreas de contenção e ‘caçar’ licenças não ativas, numa tentativa de travar um problema que já afetava bastante a habitação disponível para as famílias viverem.
Em 2020, o ano da pandemia, o total de dormidas caiu para níveis de 2013, justificados pelos períodos de confinamento obrigatório geral da população e o travão a fundo na economia, onde o turismo, em particular, foi o grande sofredor. O que é curioso nesta descida é a evidência de que, ainda assim, para se alcançarem 3,6 milhões de dormidas significa que o número de casas em AL era já demasiado elevado.
Depois da pandemia, ainda que com algumas medidas implementadas para travar o crescimento desenfreado do AL, não só rapidamente se recuperaram os números de dormidas de 2019 como as receitas bateram recordes. O ano de 2023 foi o melhor de sempre. De alguma forma, este negócio tornou-se ainda mais apetecível, porque garantia maiores lucros – e passar estas casas para o arrendamento normal elevaria também os preços, para compensar os proprietários.
Esta lógica de mercado ainda aguarda por políticas públicas que consigam dar resposta àqueles que desesperam por habitação a preços acessíveis, sem castrar os negócios daqueles que vivem do AL, que fizeram os seus investimentos e de que a sua subsistência depende também deste negócio turístico. Qualquer solução que se encontre deve ter em consideração os legítimos interesses de ambas as partes.
Em julho deste ano, os preços do AL sofreram uma correção em baixa para fazer face à quebra na procura, com casas em zonas de praia vazias, mas foi no Porto que se notou maior abrandamento. O mercado encarrega-se naturalmente de fazer estas correções, que por ora são pontuais, mas que no acumulado, no final deste ano, se irá perceber se alguma mudança está a ocorrer. Notam-se, para já, menos espanhóis em Portugal e mais concorrência de outros destinos turísticos que competem com o nosso país. E são também cada vez mais os portugueses a fazer férias no estrangeiro, sendo que Espanha oferece bons preços.
O mercado está a encarregar-se de mostrar que não é possível estar sempre a fazer subir preços em tempos de instabilidade económica. Significa que esta é uma oportunidade para o governo refletir sobre o mercado da habitação.
Lógica de mercado ainda aguarda por políticas públicas que consigam dar resposta àqueles que desesperam por habitação a preços acessíveis, sem castrar os negócios daqueles que vivem do AL, que fizeram os seus investimentos e de que a sua subsistência depende também deste negócio turístico.”