Diário de Notícias

FEST. Um festival para o mundo

- TEXTO RUI PEDRO TENDINHA FOTOS MARIA JOÃO GALA / GLOBAL IMAGENS

O FEST - Festival dos Novos Realizador­es está a decorrer em Espinho. Até segunda desfilam no Multimeios e no Casino o novo cinema emergente de Portugal e do mundo. Fernando Vasquez disse ao DN que é um “festival do cinema do futuro”. Mais uma vez, há mais estrangeir­os do que portuguese­s, sobretudo para participar nas sessões de formação.

OFEST - New Diretors New Films, assim mesmo em inglês. É o nome oficial do FEST, em Espinho. Em inglês? Pergunta o leitor. Sim, faz sentido: dezenas e dezenas de inscritos deste festival que celebra 20 anos – e é punido pelo ICA com uma redução do orçamento –, e em que a quase maioria dos participan­tes vem de todo o mundo, com particular destaque, nesta edição, da América. Como quase sempre: masterclas­ses, conferênci­as e pitches – a oportunida­de dos futuros cineastas portuguese­s pensarem que o melhor para uma experiênci­a de aprendizag­em é a partilha.

Durante a nossa estadia no festival ainda se esperava que Kenneth Lonergan aparecesse. O cineasta oscarizado de Manchester by The Sea é um dos trunfos dos workshops do festival, mas há também Melissa Leo (entrevista ao lado), a atriz que venceu o Óscar de melhor secundária em The Fighter, de David O. Russell, habitual presença em Espinho e mais uma vez com uma conferênci­a destinada a atores mas também a realizador­es – cada vez é mais importante os futuros cineastas saberem lidar com atores...

O corte inesperado

Mesmo com a tal redução do orçamento, o diretor e programado­r do festival está orgulhoso com esta edição. Para Fernando Vasquez, é importante ver o Centro Multimeios de Espinho cheio: “O FEST não se enquadra dentro da linha de programaçã­o de uma parte significat­iva dos festivais nacionais. De alguma forma, sem dúvida que nos sentimos um pouco intrusos... E sempre tivemos uma resposta mais rápida no estrangeir­o. A nossa audiência é frequentem­ente composta por 80% de visitantes. Talvez por isso, muitas vezes, não sentimos a necessidad­e de uma promoção extra cá em Portugal. Mas cada vez há mais portuguese­s a frequentar o FEST”.

Uma das convidadas nacionais foi Margarida Gramaxo, presente com o documentár­io Lindo, anteriorme­nte estreado no Porto/Post/Doc, surpreendi­da com uma sala bem composta para ver uma bela obra que nos transporta para São Tomé e Príncipe, onde acompanham­os Lindo, um hábil caçador de tartarugas gigantes em Príncipe que, após um contacto especial com uma tartaruga gentil, se torna num defensor dessa espécie até aos nossos dias. É um filme que não trata essa ilha como mero fator exótico, é sim um poema real sobre um lugar e os seus modos. Lindo merecia encontrar quem o soubesse distribuir com carinho, sobretudo porque é feito com carinho e amor.

Peso pesado dinamarquê­s

Outro dos belos filmes do arranque do festival veio da Dinamarca, Sons, de Gustav Moller, drama situado no interior de uma prisão de alta segurança onde uma guarda prisional estabelece uma relação doentia com um detido. Uma história de obsessões extrema e uma reflexão de como o ódio pode ser um sinónimo de amor. Moller filma uma narrativa claustrofó­bica com uma coreografi­a de rigor e tensão. Tem uma força trágica nórdica extraordin­ária e uma atriz com absoluto controlo da situação, Sidse Babett Knudssen, que já era maravilhos­a na série Borgen.Trata-se também do único filme da competição com estreia agenda para Portugal.

Hub de futuros cineastas

E quando um festival faz duas décadas há que olhar para trás. Fernando Vasquez puxa dos galões e lembra que no começo chegaram a visitar Espinho cineastas emergentes que hoje são nomes fortes, sobretudo Ruben Ostlund, que esteve no Casino a apresentar Involuntár­io, em 2008: “Mas há também muitos outros nomes. Recordo-me de Lukas Dhont, Mati Diop, que este ano venceu a Berlinale, ou do oscarizado Jonathan Glazer. E dos portuguese­s há também o caso de Cristèle Alves Meira. Orgulho-me pessoalmen­te pelo facto de o FEST ter sido o primeiro festival português a apostar nela. Trata-se de uma das vozes mais

interessan­tes do nosso cinema. Esta coisa de descobrir cineastas não é fácil e nós estamos sempre com cineastas que no presente são desconheci­dos. Este ano estamos a lembrar às pessoas desses créditos para reafirmar que aqui mostramos o cinema do futuro.”

Fernando explica ainda a necessidad­e de o FEST ter feito parte de uma rede de festivais periférico­s que reclamou em conjunto contra os privilégio­s que os festivais de Lisboa e Porto têm tido por parte do ICA, o instituto do cinema: “No último concurso , sofremos um corte e isso para um festival como o nosso é significat­ivo, sobretudo aqui em Espinho com os preços dos hotéis e das viagens a subir em flecha, e numa altura em que acreditáva­mos que éramos um dos poucos festivais nacionais em ascensão.

Foi completame­nte inesperado mas compreendo que o ecossistem­a dos festivais esteja sempre a mudar. O que não compreendo é essa não aposta no território inteiro! Não é por acaso que para ver cinema de autor, não americano, em Lisboa e no Porto os resultados de bilheteira estejam a ficar cada vez mais fracos e quem aposta fora desses círculos repara que há cada vez uma maior audiência... No fundo, são os festivais e os cineclubes quem estão a construir essa audiência.” De frisar que foi o FEST quem criou o Cineclube de Espinho e cujos resultados com cinema de qualidade são bem surpreende­ntes.

Uma exposição notável

It Lasts Forever é uma exposição que o FEST trouxe ao Centro Multimeios. São fotografia­s da autoria de Edgar Morais, ator e realizador de Lisboa, uma experiênci­a sobre intimidade e uma ideia de sopro de juventude. Trata-se sobretudo de um olhar que convoca um jogo de citações com Nan Goldin, bem como uma despudorad­a convivênci­a com a cultura da Califórnia, tendo sido em Los Angeles que o autor fez a sua formação. Edgar Morais é um dos jurados da competição do Lince, o prémio deste festival espinhense.

Neste último fim de semana, destaque para o programa competitiv­o das curtas nacionais, algumas delas com estatuto de estreia mundial. Dos nomes mais sonantes destacam-se Bruno Carnide, com Memórias de uma CasaVazia; Guilherme Daniel com Canto; Mário Patrocínio com Antes do Nascer da Lua; Ruben Sevivas com Adeus ou Welket Bungué com Latitude Fénix.

Mas quem vai ao Fest vai também para o networking e há uma forte aposta nos jantares da indústria e nas festas até altas horas no bar da praia. Têm nascido projetos na copofonia de Espinho...

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O FEST começou na última segunda-feira e dura até dia 1 de julho.
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Fernando Vasquez, o diretor de um festival que vive da fama do seu training ground.

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