Medo pelos venezuelanos que perderam o medo
Há uma frase poderosa que, por estes dias, circula nos cartazes e nas bocas dos milhões de manifestantes que não reconhecem a legitimidade da vitória de Nicolás Maduro nas eleições presidenciais da Venezuela. “Tiraram-nos tanto que até nos tiraram o medo”, dizem os venezuelanos que não dão mostras de quererem desmobilizar enquanto a verdade do processo eleitoral do passado domingo não for apresentada preto no branco ao país e ao mundo. Na verdade, não há mistério na atitude de Maduro, que está a seguir à risca o guião dos ditadores que aceitam ir a votos com a certeza prévia de que vão sair vencedores, dê por onde der. Desde a proibição do acompanhamento das eleições por parte de observadores internacionais independentes até à não divulgação pública das actas dos apuramentos eleitorais, passando pela intimidação dos eleitores junto às urnas de voto (sem falar no condicionamento violento e invisível inculcado durante anos na mente dos cidadãos), o regime de Maduro está a fazer tudo o que se espera que um regime opressor e anti-democrático faça quando ameaçado pela vontade soberana do povo. Os militares na rua, a crescente violência policial e para-policial, as perseguições e sequestros de adversários políticos, as detenções de centenas de manifestantes – está tudo a acontecer, infelizmente, como o esperado.
O que Maduro não esperava é que o povo perdesse o medo. E perdeu. Perder o medo é o sinal derradeiro de que ainda não se perdeu a esperança. E por isso são milhões os venezuelanos que não desarmam. Que se manifestam. Que exigem verdade e transparência. Que estão dispostos a arriscar a sua liberdade e as suas vidas em nome de uma causa maior, que é uma Venezuela livre, justa e democrática. É a vez de Maduro mostrar que não tem medo do povo e permitir uma contagem transparente dos votos, uma verificação independente dos resultados destas eleições. É isso que pedem os venezuelanos,
É a vez de Maduro mostrar que não tem medo do povo e permitir uma contagem transparente dos votos
que pede a comunidade internacional, que pede Portugal a quem tanto importa o destino das centenas de milhares de luso-venezuelanos, que vivem dentro e fora daquele país. Mesmo o Brasil e a Colômbia, países importantíssimos para a Venezuela no seu contexto geo-político, exigem a Maduro essa transparência. Infelizmente, tenho muitas dúvidas que isso venha a acontecer. E tenho sobretudo medo pelos venezuelanos que perderam o medo.