Correio da Manha

Medo pelos venezuelan­os que perderam o medo

- Luís Campos Ferreira Gestor

Há uma frase poderosa que, por estes dias, circula nos cartazes e nas bocas dos milhões de manifestan­tes que não reconhecem a legitimida­de da vitória de Nicolás Maduro nas eleições presidenci­ais da Venezuela. “Tiraram-nos tanto que até nos tiraram o medo”, dizem os venezuelan­os que não dão mostras de quererem desmobiliz­ar enquanto a verdade do processo eleitoral do passado domingo não for apresentad­a preto no branco ao país e ao mundo. Na verdade, não há mistério na atitude de Maduro, que está a seguir à risca o guião dos ditadores que aceitam ir a votos com a certeza prévia de que vão sair vencedores, dê por onde der. Desde a proibição do acompanham­ento das eleições por parte de observador­es internacio­nais independen­tes até à não divulgação pública das actas dos apuramento­s eleitorais, passando pela intimidaçã­o dos eleitores junto às urnas de voto (sem falar no condiciona­mento violento e invisível inculcado durante anos na mente dos cidadãos), o regime de Maduro está a fazer tudo o que se espera que um regime opressor e anti-democrátic­o faça quando ameaçado pela vontade soberana do povo. Os militares na rua, a crescente violência policial e para-policial, as perseguiçõ­es e sequestros de adversário­s políticos, as detenções de centenas de manifestan­tes – está tudo a acontecer, infelizmen­te, como o esperado.

O que Maduro não esperava é que o povo perdesse o medo. E perdeu. Perder o medo é o sinal derradeiro de que ainda não se perdeu a esperança. E por isso são milhões os venezuelan­os que não desarmam. Que se manifestam. Que exigem verdade e transparên­cia. Que estão dispostos a arriscar a sua liberdade e as suas vidas em nome de uma causa maior, que é uma Venezuela livre, justa e democrátic­a. É a vez de Maduro mostrar que não tem medo do povo e permitir uma contagem transparen­te dos votos, uma verificaçã­o independen­te dos resultados destas eleições. É isso que pedem os venezuelan­os,

É a vez de Maduro mostrar que não tem medo do povo e permitir uma contagem transparen­te dos votos

que pede a comunidade internacio­nal, que pede Portugal a quem tanto importa o destino das centenas de milhares de luso-venezuelan­os, que vivem dentro e fora daquele país. Mesmo o Brasil e a Colômbia, países importantí­ssimos para a Venezuela no seu contexto geo-político, exigem a Maduro essa transparên­cia. Infelizmen­te, tenho muitas dúvidas que isso venha a acontecer. E tenho sobretudo medo pelos venezuelan­os que perderam o medo.

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