DIOGO MARTINS “GOSTAVA MUITO DE SER PAI, MAS JÁ PENSEI MAIS NISSO”
O ator tem três sobrinhos e a quarta vem a caminho. Foi com eles que o desejo da paternidade ganhou maior relevância na sua vida e foi neles que pensou para construir o papel de um pai que perde o filho na peça “Se Acreditares Muito”.
Um dia, um homem de seu nome Rupert e uma mulher chamada Alex cruzam-se no metropolitano. Decidem ir beber um copo e, apesar das diferenças, juntam as suas vidas num ápice. Logo a seguir, ela fica grávida. Começa assim a peça Se Acreditares Muito, de
Cordelia O’Neil e encenação de
Flávio Gil, em cena no Teatro da Trindade, e na qual Diogo Martins contracena com Sara Barradas, com quem se estreou na representação, em 2002, na novela Amanhecer. Um texto só para dois a que o ator de 32 anos se tem entregado por completo nos últimos tempos, apesar de ter de conciliar a peça com as gravações da novela A Promessa.
– Tem estado a fazer uma peça dramática. Este papel quebra o registo mais cómico em que o público o tem visto na televisão.
Diogo Martins – Sim, essencialmente esta peça está carregada de drama, não tem um final feliz, embora a personagem não deixe de ter apontamentos de comédia. Não é uma mudança radical, o que é bom, pois uma diferença muito grande também pode distanciar o público, e não é algo que pretenda. Em teatro nunca fiz este tipo de peça, nem estive em palco apenas e só com outra pessoa. Quando há mais atores, é um trabalho mais leve e dá para distribuir todo o esforço pelas personagens que aparecem. Aqui, como sou só eu e a Sara, a responsabilidade é maior. Também é mais desafiante, pois se eu falhar, ela tem de lá estar para me ajudar e vice-versa. Sobretudo, é uma peça que toca essencialmente qualquer pessoa, porque, tenhamos ou não filhos, a perda de uma criança é um assunto marcante. Teremos sempre alguma referência, ou dos nossos sobrinhos, primos, alguém próximo que amamos e imediatamente imaginamos o que seria perdê-lo.
– Não tem filhos. Pensou nos seus sobrinhos para compor este Rupert?
– Sim, logo. No caso
hánad da peça, perda de um recém-nascido e os meus sobrinhos têm idades próximas, 5, 3 e 1 ano, e agora vai nascer uma menina. Como têm uma idade muito precoce e os amo incondicionalmente, é óbvio que a minha cabeça foi logo para aí. São as pessoas mais importantes que tenho na vida neste momento. Essa dor, que era preferível ninguém sentir – e conheço pessoas que estão a passar por isso – não tem fim, porque é demasiado marcante e, nesta peça, as personagens refletem muito bem isso. Apesar de cada um deles gerir a perda à sua maneira, ambos estão a sofrer. Eu, inconscientemente, acho que a
“É uma peça que toca qualquer pessoa, porque tenhamos ou não filhos, a perda de uma criança é marcante.”
“Sinto que cada vez mais essa entreajuda se perde no nosso meio.”
“Protagonismo nunca procurei. Sou um ator que não entra em competições, essa é que é a verdade.”
mãe acaba por sofrer muito mais, pois foi ela quem carregou aquele filho que morreu à nascença, mas não deixam os dois de ter a sua dor. É altamente denso para nós, atores, pois temos de ir a zonas de carga emocional muito intensa. Saio sempre do teatro cheio de dores de cabeça.
– Ao mesmo tempo, encontra-se a gravar a novela A Promessa.
– É verdade, o que não ajuda. Queria optar por estar a fazer esta peça a 100%, mas não foi possível, porque apareceu a novela. Comecei a gravar ainda estava em ensaios, que é a fase da descoberta da personagem, e foram semanas de trabalho mesmo muito difíceis. Tenho vivido num misto de muito cansaço e uma enorme felicidade por ter a oportunidade de estar em registos muitos diferentes.
– É um ritmo de vida frenético?
– Nesta fase, sem dúvida. Saio das gravações e venho direto para o teatro. Chego a casa, durmo e no dia seguinte estou outra vez a gravar. Mas o tempo em que estou no teatro com a Sara Barradas e o encenador é maravilhoso. Trabalhamos de uma forma genuína e percebemo-nos. Damo-nos mesmo muito bem e abrimos o nosso coração para que todos se ajudem. Sinto que cada vez mais essa entreajuda se perde no nosso meio, em que a competição é feroz, portanto, o que temos nesta peça é único.
– Sente que vive em competição por papéis ou protagonismo?
– Essa competição neste meio sempre existiu, talvez se tenha tornado pior nos últimos anos, mas não sou esse tipo de pessoa, gosto de estar a representar com alguém melhor do que eu, até prefiro, porque acho que o meu trabalho vai sobressair muito mais. Protagonismo nunca
“Tenho os meus sobrinhos e isso também me aproximou um pouco do que acho que pode ser o papel de pai e é muito bom.”
procurei. Sou um ator que não entra em competições, essa é que é a verdade. E nesta peça sinto que estou a regressar a casa, há um aconchego e partilha muito grandes.
– No teatro, o público mostra logo a reação ao que está a ver. Gosta dessa sensação ou prefere estar resguardado atrás de uma câmara?
– O público é a essência do teatro e eu gosto muito de sentir o que está a pensar durante um espetáculo ou no final. Temos logo a opinião dada, uma resposta imediata, que é essencial para um ator. Pelo menos, para mim é, pois sinto que um ator está sempre à prova em todos os trabalhos que faz. Por isso é que não somos muito seguros.
– Na vida de um ator não há nada garantido?
– Não, nada. Há sempre um recomeço. Será que vou fazer bem? Será que vão gostar? Há um desafio permanente.
– Falámos da perda de um filho e da importância dos seus sobrinhos para si. Já pensou em ser pai?
– Sim e já foi uma realidade mais próxima. Gostava muito de ser pai, na verdade, mas já pensei mais nisso. Agora, é uma coisa em que não penso tanto, mas se tiver de acontecer, acontece Entretanto, tenho os meus sobrinhos e isso também me aproximou um pouco do que acho que pode ser o papel de pai e é muito bom. Olho para o meu irmão e acho que ele é a verdadeira definição de pai. Isso enche-me de orgulho e de insegurança ao mesmo tempo, pois não sei se consigo fazer metade do que ele faz. O meu irmão é inacreditável e o maior exemplo que posso ter. Tenho sete anos de diferença dele e foi quem sempre me guiou.