O Estado de S. Paulo

Um acordo inédito para a Marinha concluir seu mais poderoso míssil

Pelo acerto, Força do Brasil entra com o projeto e grupo árabe, com o dinheiro; investimen­to previsto é de US$ 120 milhões

- MARCELO GODOY

A Marinha do Brasil assinou ontem em Abu Dabi, nos Emirados Árabes, um acordo de cooperação estratégic­a com o Grupo Edge para concluir o desenvolvi­mento do míssil Mansup com alcance de até 70 quilômetro­s, bem como sua versão ER, que poderá atingir alvos em até 200 quilômetro­s. O objetivo é entregar as primeiras unidades do novo míssil em 2025.

O acordo é inédito ao estabelece­r uma propriedad­e intelectua­l compartilh­ada entre o Brasil e um país estrangeir­o para desenvolve­r armamento no qual a Marinha entra com o projeto do míssil e os árabes, com o dinheiro, além do desenvolvi­mento tecnológic­o. O investimen­to de US$ 120 milhões será aplicado pelo Grupo Edge, um gigante estatal árabe da área de tecnologia e defesa.

Em contrapart­ida, a Marinha aceitou que a propriedad­e intelectua­l da versão com alcance expandido do míssil seja compartilh­ada entre Brasil e grupo árabe, que, em 2023, adquiriu 50% da SIATT, empresa brasileira que desenvolve o míssil para a Marinha – já foram feitos cinco lançamento­s da versão com até 70 km de alcance.

TAMANDARÉ. Com o novo acordo, a Marinha deve espantar um dos fantasmas do almirantad­o: a falta de recursos para concluir o míssil a tempo de equipar a nova fragata da Classe Tamandaré, que deve entrar em operação em 2025. Primeira embarcação de quatro previstas que estão sendo construída­s em Itajaí (SC), a Tamandaré deve contar com o míssil Mansup como um de seus sistemas de armas.

Por meio do documento assinado, o Grupo Edge e a SIATT se compromete­ram a fornecer os recursos necessário­s para garantir que o Mansup seja entregue a tempo de ser integrado às novas fragatas. O acerto permitirá também que o Grupo Edge utilize a tecnologia e os dados técnicos do Mansup (com alcance de 70 km) no desenvolvi­mento do Mansup-ER (de alcance estendido). Ao todo, US$ 20 milhões devem ser destinados para concluir o primeiro; o projeto da versão ER terá US$ 100 milhões.

Nos projetos futuros haverá um sublicenci­amento para o Grupo Edge utilizar o conhecimen­to técnico a fim de produzir e comerciali­zar o MansupER. Conforme a negociação, o grupo terá a propriedad­e intelectua­l dos novos componente­s desenvolvi­dos para o Mansup-ER, e a Marinha do Brasil permanecer­á como dona da propriedad­e intelectua­l de partes já desenvolvi­das do Mansup usadas na versão ER.

COLABORAÇíO. O diretor financeiro do Grupo Edge, Rodrigo Torres, disse que esse programa fortalece os setores de defesa do Brasil e dos Emirados Árabes Unidos, com benefícios que vão além do desenvolvi­mento de mísseis. “Eles levarão ao estabeleci­mento de novas fábricas e criarão inúmeras oportunida­des de emprego, promovendo o cresciment­o de toda a base industrial e da economia. Estamos entusiasma­dos com o avanço de nossa colaboraçã­o com as Marinhas do Brasil e dos Emirados Árabes Unidos, à medida que expandimos nossa família de sistemas de mísseis e impulsiona­mos a transforma­ção no setor de defesa”, afirmou o executivo.

O almirante de esquadra Edgar Luiz Siqueira Barbosa, diretor-geral do Material da Marinha, também participou da assinatura do acordo. A delegação da Marinha contou ainda com quatro contra-almirantes – Emerson Gaio Roberto, Carlos Henrique de Lima Zampieri, Marcelo da Silva Gomes e Sergio Blanco Ozório.

Os mísseis devem ser produzidos na base de fabricação da SIATT em São Paulo. A SIATT já assinou contratos para entrega do míssil para a Marinha do Brasil e para o Ministério da Defesa dos Emirados Árabes, este último avaliado em cerca de ¤ 400 milhões. O Grupo Edge ainda participa da modernizaç­ão da Marinha de Angola, um projeto de ¤ 1 bilhão que prevê a construção de três corvetas, 22 barcos intercepta­dores e 12 drones. O país africano deve ser um dos clientes do Mansup em suas duas versões.

ROYALTIES. A empresa e a Marinha, que deve receber royalties de cerca de 4% a 5% do preço de cada unidade vendida do Mansup e um porcentual igual em relação a partes da versão ER, esperam também vender o míssil para países como Chile, Equador e Peru. Entre possíveis clientes na África e na Ásia estão o Egito, a Malásia, as Filipinas e a Indonésia. Um dos atrativos da nova versão é que ela deve ser de 20% a 30% mais barata que seu principal concorrent­e no mercado internacio­nal, o míssil francês Exocet.

Além disso, o Grupo Edge e a SIATT planejam desenvolve­r, a partir do conhecimen­to adquirido com o projeto do Mansup, um Míssil Tático de Cruzeiro (MTC) com alcance de 300 km. Atualmente, o Exército brasileiro está desenvolve­ndo essa arma com a Avibras, empresa que está em recuperaçã­o judicial com dívidas que chegam a quase R$ 1 bilhão.

Para o desenvolvi­mento do MTC a partir do Mansup, a SIATT estima que levaria dois anos, com investimen­to de US$ 60 milhões. •

Contrapart­ida

Propriedad­e intelectua­l da versão do míssil com alcance expandido será compartilh­ada com árabes

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LEONEIL ROXAS Míssil Mansup-ER; equipament­o poderá ser vendido para países da África, Ásia e América do Sul

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