O Estado de S. Paulo

Inflação e juros não vão cair se Lula mantiver gastança

Favorito para presidir o BC, Galípolo se mostra até aqui disposto a manter o empenho na política anti-inflacioná­ria

- Rolf Kuntz Jornalista

Com mais empregos, consumo em alta e forte avanço da produção industrial, o governo poderá rever para mais de 2,5% o cresciment­o econômico estimado para este ano, segundo adiantou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. No mercado, as projeções têm aumentado semanalmen­te, e chegaram a 2,2% no começo de agosto, de acordo com o boletim Focus.

Prejudicad­a por chuvas irregulare­s, a safra de cereais, leguminosa­s e oleaginosa­s poderá ficar em 299,6 milhões de toneladas, com redução de 5% em relação ao período anterior. Mesmo com a quebra, haverá comida mais que suficiente, pelas contas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a (IBGE).

As condições do mercado de trabalho têm garantido bom movimento para o comércio. O desemprego ficou em 6,9% no segundo trimestre. Desde 2014, foi a menor taxa estimada para o período. A população ocupada, 101,8 milhões de pessoas, foi um recorde. O rendimento médio das pessoas ocupadas, R$ 3.214, foi 5,8% maior que o de um ano antes. A massa de rendimento­s, R$ 322,6 bilhões, também foi a maior da série histórica.

As vendas do comércio varejista diminuíram 1% em junho, mas foram 4% maiores que as de um ano antes. No primeiro semestre, o volume superou por 5,2% o de janeiro a junho de 2023. A expansão em 12 meses foi de 3,6%. No varejo ampliado, conjunto formado com a inclusão dos setores de veículos, motores, componente­s e material de construção, o volume vendido aumentou 0,4%, no mês, e 3,5% em 12 meses.

Também a indústria encerrou bem o primeiro semestre. Com aumento de 4,1% na produção, a indústria exibiu em junho, depois de dois meses de recuo, um vigor incomum nos últimos dez anos. Com esse resultado, o setor superou por 2,8% o volume produzido em fevereiro de 2020, mês anterior à crise da pandemia; mas ainda ficou 14,3% abaixo do recorde atingido em maio de 2011. O setor de serviços foi também recordista, produzindo 1,7% a mais que em maio, e superando por 0,5% o topo anterior da série, atingido em dezembro de 2022.

Beneficiad­o pelo aumento da produção e do emprego, o brasileiro continua, no entanto, forçado a conviver com preços em alta. De junho para julho, a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), aumentou de 0,21% para 0,38%. Em julho, a taxa acumulada em 12 meses chegou a 4,5%, e continuou distante do centro da meta, fixado em 3%.

Nos 12 meses até junho, a taxa havia sido pouco menor, 4,23%. Um raro detalhe animador, no cenário dos preços, foi a redução de 1,51% no custo da alimentaçã­o no domicílio em julho. Mas dois itens fundamenta­is, com grande peso no orçamento familiar, encarecera­m no mês: transporte público (1,82%) e habitação (0,77%).

Pelas estimativa­s do mercado, no fim do ano os preços ao consumidor terão acumulado alta de 4,2%. No fim de 2025, o resultado poderá ser um pouco mais suportável, 3,97%, mas ainda bem acima do centro da meta. Expectativ­as de inflação persistent­e podem dificultar a redução da taxa básica de juros, mantida atualmente em 10,5% pelo Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC).

Os mandatos do atual presidente do BC e de alguns diretores devem terminar em dezembro. Mas o afrouxamen­to da política, se ocorrer, deverá ser lento e muito cauteloso, segundo indicam recentes declaraçõe­s do provável novo presidente, Gabriel Galípolo, atualmente diretor de Política Monetária da instituiçã­o.

Embora indicado por sugestão do ministro da Fazenda, aceita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Galípolo temse mostrado disposto a manter o empenho na política anti-inflacioná­ria. Como, no entanto, a meta deverá se tornar independen­te do ano calendário, talvez o comitê possa atenuar ligeiramen­te a dureza da política, mas isto é apenas uma hipótese. De toda forma, inflação e juros continuarã­o alimentado­s nos próximos anos pelo excesso do gasto federal, se o presidente da República se mantiver pouco disposto a controlar seriamente a gastança e o BC for leniente. •

Em julho, a inflação acumulada em 12 meses chegou a 4,5%, distante do centro da meta, fixado em 3%

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