Vizinhos da Cracolândia temem dispersão após uso de grades
Moradores relatam que ‘fluxo’ já está se deslocando; prefeitura diz que gradis ajudam a garantir circulação e atendimento médico
A colocação de grades e cavaletes de ferro na Rua dos Protestantes, local com a maior concentração de usuários e traficantes de drogas no centro de São Paulo, traz medo e apreensão aos moradores da região. Quem vive nas proximidades da Santa Ifigênia e da Luz teme a dispersão dos dependentes químicos para vias próximas.
O gerente de um hotel, que se identificou apenas como Geraldo, diz que os usuários já estão se espalhando pelas ruas próximas, como Gusmões e General Osorio. Hoje, o fluxo está na Rua dos Protestantes, entre a própria Rua dos Gusmões e a General Couto de Magalhães. “Eles estão em pequenos grupos, de quatro, cinco, seis usando drogas. Estão mais espalhados”, afirma.
A dona de casa Elizete Pereira, de 39 anos, tem opinião semelhante. “Quando eles estão em um lugar só, a gente sabe os cuidados que tem de tomar. Mas eles não vão ficar só no ‘cercadinho’ com a polícia em cima. Já estão andando.”
Segundo a Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos da Prefeitura de São Paulo, o objetivo da delimitação da rua, que agora tem espaço para a circulação de veículos, é criar uma área da saúde e melhorar o atendimento médico.
Antes, a rua era toda tomada pelos usuários e traficantes. “O objetivo é favorecer o trabalho dos agentes de saúde e assistência, garantir maior segurança aos agentes e facilitar o trânsito de veículos das equipes”, informou o órgão.
Nos últimos dois anos, usuários e traficantes estão se movimentando por vários pontos da região central. Durante décadas, eles ocuparam as proximidades da Estação Julio Prestes, perto da Estação da Luz.
No início de 2022, eles se deslocaram para a Praça Princesa Isabel, que também foi cercada por grades.
Após uma operação policial, a região foi esvaziada e o fluxo se espalhou por 11 pontos. O local de maior tensão foi nas proximidades da Rua Santa Ifigênia. Em um dos episódios mais dramáticos, uma loja de eletrônicos foi invadida e saqueada em novembro.
REVISTA. A repressão policial se intensificou nos últimos dias. O Estadão presenciou pelo menos seis viaturas da Guarda Civil Metropolitana (GCM). Os agentes faziam a revista de usuários e proíbem bolsas, mochilas e sacolas. A montagem de barracas de camping também é proibida – os agentes policiais argumentam que os espaços são usados para tráfico de drogas.
A colocação de grades não é inédita. O médico Flavio Falcone, morador da região central, afirma que acompanhou ação semelhante quando o fluxo ficou concentrado na Rua Helvétia com a Avenida São João, em 2022. “Foi igual. Na ocasião, o fluxo ficou dispersado, depois se organizou novamente em outro local”, diz o psiquiatra.
No ano passado, a Praça da Sé também foi cercada, com a justificativa de proteger o patrimônio público. Ali, a Defensoria Pública de São Paulo questionou as razões para a colocação dos gradis.
Depois de o governo afirmar que “esse tipo de medida é realizada pela GCM e pela zeladoria”, o vice-governador Felicio Ramuth (PSD) confirmou a participação do poder estadual, mas negou restrições de circulação. “Não existe portão de entrada e saída. É um ordenamento para garantir a fluidez de veículos. O direito de ir e vir permanece garantido também para o cidadão comum, com mais segurança. Existe uma faixa por onde os pedestres podem se deslocar.” •
Presença ostensiva Agentes revistam usuários e proíbem bolsas, mochilas e sacolas, assim como instalação de barracas