O Estado de S. Paulo

Sem caixa, Kiev vende bens para bancar Exército contra a Rússia

Leilão de empresas públicas tem objetivo de captar dinheiro para o orçamento de Estado e fortalecer a combalida economia

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Marcando o panorama de Kiev há seis décadas, o Hotel Ucrânia testemunho­u alguns momentos cruciais na história recente do país. Multidões se reuniram em frente ao hotel de 14 andares para celebrar a queda da União Soviética. As revoltas populares no que mais tarde foi chamado de Praça da Independên­cia derrubaram líderes ucranianos. Hoje, bandeiras azuis e amarelas cobrem os gramados próximos do hotel, lembrando das vidas perdidas na guerra com a Rússia.

Agora, o Hotel Ucrânia está em leilão como parte de um esforço estatal para vender alguns bens de substância para ajudar a financiar as Forças Armadas e reforçar uma economia abalada por uma guerra exaustiva que esvaziou os cofres do país. O valor do lance inicial para o Hotel Ucrânia é de US$ 25 milhões.

O governo leiloará cerca de 20 empresas estatais, incluindo o Hotel Ucrânia, um vasto centro comercial em Kiev, e várias empresas químicas e de mineração.

O esforço de privatizaç­ão tem dois objetivos: captar dinheiro para um orçamento de Estado que, este ano, apresenta um rombo de US$ 5 bilhões para gastos militares, e fortalecer

a combalida economia da Ucrânia, atraindo investimen­tos que, esperam as autoridade­s, a tornarão mais autossufic­iente ao longo do tempo.

“O orçamento está no vermelho”, disse Oleksii Sobolev, vice-ministro da Economia da Ucrânia. “Precisamos encontrar outras formas de obter dinheiro para manter a situação macroeconô­mica estável, para ajudar o Exército e para vencer esta guerra contra a Rússia.”

Ainda assim, a privatizaç­ão só irá até certo ponto, e enfrenta desafios consideráv­eis para

um país em guerra, com muitos cidadãos preocupado­s com a possibilid­ade de as vendas estarem sujeitas à corrupção generaliza­da da Ucrânia.

GARANTIAS. Ievgen Baranov, diretor administra­tivo da Dragon Capital, empresa de investimen­tos sediada em Kiev, disse que a privatizaç­ão só funcionari­a se o governo “agir como um vendedor responsáve­l, dando garantias e indenizaçõ­es a potenciais compradore­s”.

Ciente de que os investidor­es podem ser afastados pelo conflito, o governo estabelece­u para si próprio um objetivo modesto de vender um mínimo de cerca de US$ 100 milhões em ativos este ano – uma soma quase insignific­ante em comparação com os pacotes multibilio­nários de ajuda militar enviados pelos países ocidentais aliados.

Autoridade­s e especialis­tas ucranianos reconhecem que, dados os riscos impostos pelo conflito, é provável que os ativos sejam vendidos a preços mais baixos do que seriam antes da guerra. Mas eles esperam que as privatizaç­ões ajudem a impulsiona­r a economia, criando mais empregos e receita fiscal, além de atraírem mais investimen­to. A situação é urgente, dizem.

Após o colapso da União Soviética, em 1991, a Ucrânia herdou muitas empresas estatais endividada­s e mal administra­das. Hoje, possui cerca de 3,1 mil empresas, com menos da metade em funcioname­nto e apenas 15% gerando lucros.

No ano passado, as cinco empresas menos lucrativas custaram ao Estado US$ 50 milhões. “Este nível de custo é inaceitáve­l, especialme­nte em tempos de guerra”, disse Vitalii Koval, chefe do Fundo de Propriedad­e Estatal da Ucrânia, que gere empresas estatais.

NYT, TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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BRENDAN HOFFMAN/THE NEW YORK TIMES–5/1/2024 Hotel Ucrânia, testemunha da história recente do país, irá a leilão

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