Na contramão do resto do mundo
Apolarização política nos Estados Unidos fez mais uma vítima: a moeda digital a ser emitida pelo Federal Reserve (Fed), o banco central do país. A Câmara dos EUA aprovou um projeto de lei que impede o Fed de criar uma moeda digital (a CBDC, ou Central Bank Digital Currency) a menos que haja uma autorização explícita do Congresso. Denominada CBDC Anti-Surveillance State Act, a proposta foi aprovada pela maioria Republicana, mas ainda precisa passar pelo Senado e ser sancionada pelo presidente para virar lei.
O argumento principal foi o de proteger a privacidade financeira dos americanos contra possíveis abusos de vigilância governamental e em defesa da soberania individual. Isso em total dissonância com a perspectiva mundial de criação de modas digitais. Atualmente, 134 países e uniões monetárias estão tratando da implantação de um ativo que seja a versão virtual da moeda física – algo que representa 98% do PIB mundial. Desse total, 64 países estão em fase avançada de desenvolvimento, entre eles, Brasil, China, Japão, Índia e Rússia. No mesmo estágio, estão 19 dos países do G20.
Uma moeda digital emitida por banco central é regulada pela autoridade monetária do país e funciona como dinheiro tradicional. Por outro lado, uma criptomoeda, como o Bitcoin ou a Ethereum (ETH), é emitida e distribuída de forma descentralizada, tratada como ativo financeiro. A aprovação da lei que inibe a criação de uma CBDC nos Estados Unidos pode trazer impacto negativo para o sistema financeiro internacional, influenciando outros países sobre essa questão.
Além disso, essa situação mostra a profunda divisão social e política vivida nos Estados Unidos. Hollywood reflete esse fenômeno em vários filmes, em especial um dos seus últimos lançamentos – Guerra Civil, estrelado por Wagner Moura, que pode ser visto como uma metáfora do conflito social e da polarização política naquele país.
A proposta aprovada na Câmara acabou dando novo ânimo ao mercado de criptomoedas. O embate em torno das criptos ganhou espaço na campanha presidencial americana. Trump declarou que vai aceitar doações em criptomoedas e fez elogios ao Bitcoin, enquanto o presidente Biden quer “morte lenta e dolorosa” para o ativo. Curioso que o mercado faz dinheiro mesmo nesse ambiente conflituoso. Foram lançadas criptomoedas meme de políticos, como a Jeo Boden, com capitalização de mercado de R$ 114,6 milhões, e a Danold Tromp, com valor de R$ 19,6 milhões.
No nosso País, a ideia é de inclusão financeira, e o Banco Central está dando exemplo: a nossa moeda digital, o Drex, já está na segunda fase, quando são testados os possíveis casos de uso e as funcionalidades do ativo, como os contratos inteligentes. •
Câmara dos EUA aprova regra que dificulta criação de uma moeda digital do país
PROFESSOR DE FINANÇAS DA FGV-SP