O Estado de S. Paulo

Na contramão do resto do mundo

- Fabio Gallo

Apolarizaç­ão política nos Estados Unidos fez mais uma vítima: a moeda digital a ser emitida pelo Federal Reserve (Fed), o banco central do país. A Câmara dos EUA aprovou um projeto de lei que impede o Fed de criar uma moeda digital (a CBDC, ou Central Bank Digital Currency) a menos que haja uma autorizaçã­o explícita do Congresso. Denominada CBDC Anti-Surveillan­ce State Act, a proposta foi aprovada pela maioria Republican­a, mas ainda precisa passar pelo Senado e ser sancionada pelo presidente para virar lei.

O argumento principal foi o de proteger a privacidad­e financeira dos americanos contra possíveis abusos de vigilância governamen­tal e em defesa da soberania individual. Isso em total dissonânci­a com a perspectiv­a mundial de criação de modas digitais. Atualmente, 134 países e uniões monetárias estão tratando da implantaçã­o de um ativo que seja a versão virtual da moeda física – algo que representa 98% do PIB mundial. Desse total, 64 países estão em fase avançada de desenvolvi­mento, entre eles, Brasil, China, Japão, Índia e Rússia. No mesmo estágio, estão 19 dos países do G20.

Uma moeda digital emitida por banco central é regulada pela autoridade monetária do país e funciona como dinheiro tradiciona­l. Por outro lado, uma criptomoed­a, como o Bitcoin ou a Ethereum (ETH), é emitida e distribuíd­a de forma descentral­izada, tratada como ativo financeiro. A aprovação da lei que inibe a criação de uma CBDC nos Estados Unidos pode trazer impacto negativo para o sistema financeiro internacio­nal, influencia­ndo outros países sobre essa questão.

Além disso, essa situação mostra a profunda divisão social e política vivida nos Estados Unidos. Hollywood reflete esse fenômeno em vários filmes, em especial um dos seus últimos lançamento­s – Guerra Civil, estrelado por Wagner Moura, que pode ser visto como uma metáfora do conflito social e da polarizaçã­o política naquele país.

A proposta aprovada na Câmara acabou dando novo ânimo ao mercado de criptomoed­as. O embate em torno das criptos ganhou espaço na campanha presidenci­al americana. Trump declarou que vai aceitar doações em criptomoed­as e fez elogios ao Bitcoin, enquanto o presidente Biden quer “morte lenta e dolorosa” para o ativo. Curioso que o mercado faz dinheiro mesmo nesse ambiente conflituos­o. Foram lançadas criptomoed­as meme de políticos, como a Jeo Boden, com capitaliza­ção de mercado de R$ 114,6 milhões, e a Danold Tromp, com valor de R$ 19,6 milhões.

No nosso País, a ideia é de inclusão financeira, e o Banco Central está dando exemplo: a nossa moeda digital, o Drex, já está na segunda fase, quando são testados os possíveis casos de uso e as funcionali­dades do ativo, como os contratos inteligent­es. •

Câmara dos EUA aprova regra que dificulta criação de uma moeda digital do país

PROFESSOR DE FINANÇAS DA FGV-SP

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil