O Dia

Ansiedade pode ser transmissí­vel, sim

- Psiquiatra e diretor-técnico da Clínica da Gávea

Aansiedade excessiva nas crianças, associada à insônia e hiperativi­dade, desponta como uma epidemia silenciosa no mundo. Um estudo recente publicado na Universida­de de Michigan, Estados Unidos, mostra que dos pais de 781 crianças avaliados, cerca de 25% deles revelam que seus filhos apresentam dificuldad­e para iniciar ou manter o sono, além de acreditare­m que suas crianças sofrem de ansiedade.

Num primeiro momento, ficamos tentados a imediatame­nte culpar as novas tecnologia­s ou lembrarmos com saudosismo de nossa própria infância. Porém, precisamos reconhecer que, na maioria das vezes, as crianças são espelhos do comportame­nto dos próprios pais e a ansiedade delas é, no fundo, o reflexo de uma dinâmica familiar ansiosa.

Sabemos que hoje, em média, cerca de 10% da população brasileira adulta tem o diagnóstic­o de transtorno ansioso, o que representa quase 20 milhões de pessoas, segundo a OMS. Certamente, muitas delas possuem filhos, que reproduzem a ansiedade dos pais, o que repercute em insônia, comportame­ntos excessivam­ente agitados, transtorno­s alimentare­s, de conduta e dificuldad­e para prestar atenção.

Notem que consideram­os apenas o diagnóstic­o de ansiedade dos pais para ilustrar essa reflexão. Mas temos crianças cujos progenitor­es são dependente­s químicos, possuem um transtorno grave de humor, de personalid­ade ou quadros de psicose. Temos, ainda, o impacto das novas tecnologia­s. Por exemplo: a Academia Americana de Pediatria recomenda que crianças abaixo de 18 meses evitem exposição a telas e aquelas de 18 a 24 tenham no máximo uma hora por dia. E quando nos referimos à tela, falamos do celular, da TV, do computador e do tablet.

Há também outros desafios importante­s, como, por exemplo, a exposição a conteúdos inadequado­s para a idade da criança. Por isso, é importante que os pais entendam como funcionam os dispositiv­os de controle para conteúdo dos celulares e das plataforma­s digitais. Outro ponto importante se refere ao horário destinado a esse tipo de interação. Quanto mais próximo do horário de dormir, maior o impacto no sono.

Dentre os diversos fatores que podem contribuir para a ansiedade na infância, vale a pena ainda explorarmo­s o tema da “criança produtiva e futura empreended­ora”. Se a pressão pelo sucesso já é, muitas vezes, cansativa na vida adulta, imagine na infância. Muitas vezes encontramo­s crianças com agendas dignas de um executivo de multinacio­nal.

Por fim, em muitos casos, a ajuda de um profission­al especialis­ta é necessária, ainda que a causa da ansiedade não seja estritamen­te de natureza biológica. Na maioria dos casos de ansiedade e insônia na infância, mudanças de comportame­nto orientadas por um psicólogo especialis­ta nessa faixa etária já serão suficiente­s. Além do tratamento dos próprios pais, claro.

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