Os Supremos: Estados Unidos e Brasil
Politização das cortes supremas, no Brasil e nos Estados Unidos, tem feito as duas instituições enfrentarem crises de legitimidade .....
Analisávamos decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos. Em jantar com os professoresd ah arv ar dl aw,terry Fisch ere DavidB.Wilkins. Dezembrode 2000. lám esmoem Cambridge, Massachussetts.
De repente :“a nossa suprema Corte está prejudicando a democracia” disse Fischer, criador do Beckman Center. Prenunciou um mal-estar. Com certa desesperança. Se não foram estas exatas palavras, o sentido foi.
Meses antes, houvera a disputa presidencial George W. Bush versus Al Gore. Acirrada. Quem ganhasse o colégio eleitoral da Flórida seria o presidente. Após a contagem inicial de votos, a margem que separava os dois candidatos naquele colégio eleitoral era de menos de 0,5%.
Laurence Tribe, também professor de Harvard, era o advogado de Gore. Requereu à Suprema Corte recontagem dos votos por máquinas, segundo a legislação eleitoral daquele Estado. Alegou suspeita de erro ou mesmo de fraude. Mas as cédulas dos varios condados eram diferentes. Não seguiam padrão. Ambiente propício a erros e manipulações.
Os Estados Unidos pararam. A democracia parou. Esperava-se decisão da Corte.
Que deu vitória a Bush. O res toé historia ... Ma soque espantara terryfischerfo ramas justificativas.
Dada a avaliação da Corte de que o processo de recontagem e mandamento provavelmenteestava sendo conduzido de maneira inconstitucional, a Corte [em liminar do dia 9 de dezembro de 2000] suspendeu a ordem que direcionava a recontagem para que pudesse ouvir este caso e emitir uma decisão rápida. O dispositivo [legal, do Estado da Flórida,] de contestação [das eleições], como foi mandatado pela Supremacorte estadual, não está bem calculado para sustentar a confiança que todos os cidadãos devem ter no resultado das eleições. O Estado [da Flórida] não demonstrou que seus procedimentos incluem as salvaguardas necessárias. (Tradução nossa). E finalizava:
Nossa consideração está limitada às circunstâncias presentes, pois o problema da proteção igualitária nos processos eleitorais geralmente apresenta muitas complexidades.
Para Fisher, clara decisão política. A Corte decidira por conta de“provável inconstitucionalidade”. que o sistema eleitoral “Não sustenta a confiança que todos os cidadãos devem ter”. Decisão “limitada às circunstâncias presentes”.
Ou seja, decisão única, pressionada pela pressa, e que não faria jurisprudência. Nunca mais.
Robert Dahl, clássico cientista político, em seu livro “A Constituição norte-americana é democrática ?”, já previa erros de modelagem eleitoral na democracia americana. Entre eles, o principal: o voto não é direto. É por colegiados. Cada estado com seus sistemas, seus padrões, suas regras.
O resultado pode ser que a maioria não eleja a presidência, mas sima minoria. Não deu ou dá outra. Gore teve mais votos do que Bush e perdeu. Hilary teve mais votos do que Trump e perdeu.
Para Fischer,apont ado iceberg da politização judicial suprema emergia. E avançaria silenciosamente, no decorrer dos anos. cada vez mais visível. Até hoje. E de várias formas.
Em 2016, Senado de maioria republicana se recusou a decidir sobrem erric kg ar land, o indicado por Barack Obama para a vaga de Antonin Scalia na Suprema Corte. Naquela ocasião, Mitch Mcconnell, líder do Senate Judiciary Committee, fez claro bloqueio. Disse a Obama: “Presidente, o senhor não vai ocupara vacância da Suprema Corte ”.
Não ocupou. o bloqueio político da votação por decurso de prazo legald eu certo.qu andoas sumiu,Trumpmud ou. Indicou justices comobrettk avana ugh e amy coneybarrett. Votados e aceitos.
Em 2022, a Cortejá com maioria republicana derruba landmark cases como a histórica decisão de Roe v. Wade, sobre aborto. No mesmo ano, outra decisão de matiztr um piano amplia o acessoa armas. Agora em 2024, a Corte confere imunidade para atos oficiais dos presidentes, inclusive para Trump. O Chief Justice John Roberts, conservador indicado por George Bush, em seu voto pela maioria, estabeleceu:
O presidente não goza de imunidade pelos seus atos não oficiais, e nem tudo que o Presidente faz é oficial. O Presidente não está acima da lei. Mas o Congresso não pode criminalizara condução presidencialdas responsabilidades do Executivo soba Constituição. E o sistema de separação de poderes, desenhado pelos constituintes, sempre demandou um Executivo enérgico e independente. O Presidente não pode, portanto, ser acusado pelo exercício do seu núcleo de poderes constitucionais e ele tem direito a, no mínimo, uma imunidade presuntiva de acusações por todos os seus atos oficiais. Essa imunidade se aplica igualmente a todos os ocupantes do Salão Oval, independente de razões políticas ou partidárias .( tradução nossa).
A Justice Sonia Sotomayor, indicada por Obama, como relatora do dissenting vote, reagiu. Explicitou a fratura na corte. Um dos mais violentos votos jamais escritos. Grito de alerta.
A decisão de hoje, de garantira ex-presidentes imunidade penal, remodela a instituição da presidência. Ela zomba do princípio fundacional da nossa Constituição e sistema de Governo de que ninguém está acima da lei. [...] Porque a nossa Constituição não protege um ex-presidente de responder por atos criminosos e de traição, eu divirjo. [...]
A Corte agora confronta uma questão que nunca precisouser respondida na história da nação: se um ex-presidente goza de imunidade contra persecução criminal federal. A maioria pensa que deveria gozar, então inventa uma imunidade a textual, a histórica e injustificável para poro Presidente acimada lei .[...] Presuntiva ou absoluta, soba decisãoda maioria, o susos que o presidente faz de seus poderes oficiais para quaisquer fins, mesmo os mais corruptos, são imunes à persecução. (Tradução nossa).
A repercussão foi mundial. Aumenta a discricionariedade,quase arbítrio dop residente para declarar guerra—por exemplo. O Financial Times, Londres, em edital, entendeu que a corte teria derruba doum dos pilares da democracia:
Com os tribunais agora incapacitados de responsabilizarumpresidentepelamaioria das ações tomadas no cargo, a decisão transfere essa responsabilidade para o Senado e a Câmara dos Deputados. Mas, como mostram os impeachments fracassados de Trump, a atual legislatura polarizada dosestadosunidosrevelou-se mal equipada para conter um demagogo. Ao priorizar uma Presidência “enérgica” em detrimento de uma presidência responsável, os juízes conservadores da corte destruíram um pilar fundamental do sistema americano.
Comomontesquieu,acorte entendeu que os riscos de acusações poderiam comprometer a urgência exigida do ocupantedessecargo.oexecutivo não poderia agir apreensivo.
“Se os atos oficiais de um ex-presidente forem rotineiramente sujeitos a escrutínio em acusações criminais, a ‘independência do Executivo’ pode ser significativamente comprometida”, como escreveochiefjusticejohnroberts.
Mais potencial arbítrio. A definição de “atos oficiais” e “não-oficiais” do Presidente vai depender de juízes de instâncias inferiores.
Carta branca à Casa Branca. Daí a reação de Joe Biden. Propôsemendaàconstituição para reforma da Corte: ministros não vitalícios. Com mandatos.
Mas não é somente a crescente político-partidarização da Corte que estaria afetando ademocracia,segundobiden.
Láecá,odescréditopelafalta de ética da corte e potencial quase latente corrupção estão vindoàluzdodia.desgastaindispensável legitimidade.
O caso mais famoso de potencial corrupção é do Justice Clarence Thomas. Alvo de grande indignação. Propublica, 150 editores, jornalismo especializadoemacompanhar as instituições políticas, órgão independenteesemfinslucrativos, mostrou que, por mais de duas décadas, o Justice teve férias luxuosas pagas diretamente pelo bilionário republicano Harlan Crow.
Com casos na justiça. Clarence Thomas e esposa voavam nos seus jatinhos particulares. Faziam cruzeiros no seu iate. Passavam estadias no seu resort. Conviviam com o bilionário no dia a dia. A última viagem à Indonésia do Justice, presenteadaporcrow,custaracerca de 500 mil dólares em 2019.
O Justice violou alei. Que requer que todo presente — físico ou não, joias ou não — recebido pelos magistrados e membros do Congresso tenha que ser declarado.
As relações perigosas de ministros compartes, lá ecá, não são apenas debate sobre quem paga ou não. Ou quanto recebeu ou não. É importante o potencial contágio que fere a imparcialidade. Relações ocultas. Sem imparcialidade não se tem justiça. Para citar Oliver W. Hol mes:“a luz do sol éo melhor desinfetante ”.
Em 2023, o The New York Times publica “Na Suprema Corte, aética questiona as ligações empresariais de uma esposa”. Jane Roberts, esposa atual do Chief Justice John Roberts, teria uma firma de consultorias para estatégias de litigância na Suprema Corte. Teria ganhado mais de 10 milhões de dólares com as consultorias para escritórios de advocacia de ponta. Revista Forbes confirma.
Cá, parentese esposas de ministros têm escritórios de advocacia com interesses e litigâncias no Supremo.
Lá ecá, o culpado nãoéo sol da mídia. É anoite da intransparência.
Em 2021, Martha-ann Alito, esposa do justice Samuel Alito, fez questão de hastear abandeira americana de cabeça par abaixo, simbo lodos apoiadores de Trump. Nas suas casas na Virgínia e Nova Jersey,seg undo othewashi ng tonPost.
Quando um vizinho colocou uma placa dizendo “Fuck Trump”. Sua esposa apenas reagiu. Não havia conotação política — alegou Justice Alito... indicado por George W Bush.
Estes “microssintomas”, talvez “microbactérias”, se não controlados, geram infecção, macropatologias institucionais. Necessitam de remédios. Inflamam a democracia.
Lá, ao contrário de cá, Corte americana tenta se automedicar. Criou e adotou um código de Conduta. Em 2023. Diz o preâmbulo:
[...] Em sua maioria, essas regras e princípios não sao novas. A Corte tem, há muito, um conjunto equivalente de regras éticas derivadas da common law, isto é, um corpo normativo que deriva de uma variedade de fontes [...] A ausência de um Código, no entanto, levou, nos últimos anos, a um malentendido de que os magistrados dessa corte, diferentemente dos outros juristas neste país, consideram-se irrestritos por normas éticas. Para resolver esse malentendido, nós estamos expedindo esse Código, que largamente representa uma codificação de princípios que há muito reconhecemos como governantes da nossa conduta. (Tradução nossa).
No Brasil, João Gabriel de Lima, da Folha de São Paulo, tem insistido na necessidade do nosso Supremo ter também seu próprio código de conduta. Mas o ministro Alexandre de Moraes lhe diz não ser necessário.
Importante, entretanto, seria pelo menos cumprir as normas declaro conteúdo éticodeterminados pe lalo man. Por exemplo:
Art. 35 - São deveres do magistrado: [...]VI - comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término; [...] VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.
Art.36-Éved adoa o magistrado: I-exercer o comércio ou participar de sociedade comercial,inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista; II - exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração; III - manifestar, por qualquer me iode comunicação, opinião sob reprocesso pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada acrítica nos autos e em obras técnicas o uno exercício do magistério.
Para o filósofo do Direito Ronald Dworkin, “os ministros precisam se entender como colegas uns dos outros, do passado e do futuro, com quem constroem uma coerente moralidade constitucional, e precisam cuidar de ver se a sua contribuição se harmoniza no todo” (tradução nossa).
Supremos são orquestras. Não há sinfonias apenas com solistas.
O então mal-estar de Terry Fischer parece hoje ganhar o mundo. A independência e imparcialidade de árbitros é patrimônio cultural e ético mundial.
Agora em Paris, Ben Lowe foi expulso dos Jogos Olímpicos depois de viralizar sua foto ao lado de um dos surfistas que disputariam aprova na qual iria arbitrar.
A Associação Internacional de Surfe diz que, para proteger o valor da imparcialidade, integridade e justiça da competição, removeu o árbitro. O Comitê Olímpico Internacional acatou.
A emenda de Joe Biden vai provavelmente para o cemitério de emendas constutucionais americanas.
Diante das imagens, fatos e dados, informações, que chegam até nós dos Estados Unidos, Ruy Castro aqui na Folha, em“Era um aveza America”, perguntou: “Por todo sesses séculos, convivemos mesmo coma maior democracia do mundo ou com uma ‘ilusão fabricada pelos próprios americanos”?
Lembro a pergunta ao imenso artista J. Borges, pernambucano, que acabou de falecer: “Quando você sabe que sua obra tem sucesso?”
Ele, artista popular, não do andar de cima mas do chão da fábrica da vida, respondeu: “Quando o cordel, a poesia, ‘bate’ no sentimento do povo ”.
Bate ré palavra polissêmica. Pode resultar em indignação e deslegitimação. ou admiração e legitimação. Aos Supremos para decidirem.
Pesquisa: Guilherme Soares