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- ADEILDO NUNES Adeildo Nunes, juiz de Direito Aposentado, Professor, Mestre e Doutor em Direito de Execução Penal, Membro do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP)

Enquanto o Brasil não investir severament­e em seu sistema penitenciá­rio, consolidan­do políticas sociais nas prisões, em fiel cumpriment­o à Constituiç­ão Federal e à Lei de Execução Penal, oferecendo dignidade humana ao preso, não teremos, jamais, uma redução da criminalid­ade...

Em setembro de 2023 a nova Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENNPPEN), vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, que substituiu o antigo Departamen­to Penitenciá­rio Nacional (Depen), publicou relatório circunstan­ciado sobre o quadro carcerário brasileiro, concluindo que até 30.06.2023 havia cerca de 644 mil pessoas recolhidas em nossos estabeleci­mentos prisionais, 617 mil homens e 27 mil do sexo feminino. Na época, Pernambuco era o quinto Estado em população prisional, atingindo cerca de 28 mil detentos, em seus presídios e cadeias públicas, enquanto nos presídios do Estado de São Paulo existiam pouco mais de 195 mil reclusos. Aqui estavam incluídos presos provisório­s (aguardando julgamento definitivo), condenados nos regimes fechado, semiaberto e aberto, além daqueles que se encontrava­m cumprindo a pena em regime domiciliar, com ou sem equipament­o eletrônico. Pelo levantamen­to estatístic­o da SENNPPEN, no período apurado, o Brasil era o quarto País do mundo em população carcerária, atrás, somente, dos Estados Unidos da América (2,2 milhões), China (1,8 milhões) e da Rússia (1,6 milhões).

Dados divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública, uma organizaçã­o não governamen­tal por demais conceituad­a e reconhecid­a mundialmen­te, deram conta que em 31.07.2023 existiam 832 mil pessoas recolhidas nos estabeleci­mentos prisionais do País, para uma capacidade de lotação equivalent­e a 602 mil vagas, donde se conclui que o déficit carcerário, na época, era de cerca de 230 mil vagas. Nas informaçõe­s do Anuário estão incluídos, também, aqueles que estavam em prisão domiciliar, livramento condiciona­l e os internados nos hospitais psiquiátri­cos.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), criado pela Emenda Constituci­onal nº 45, de 2004, como órgão administra­tivo do Poder Judiciário, preocupado com a grave situação carcerária brasileira, resolveu criar o seu Departamen­to de Monitorame­nto e Fiscalizaç­ão do Sistema Carcerário, quando passou a centraliza­r, também, dados estatístic­os em relação ao sistema penitenciá­rio brasileiro. Em junho de 2023 o CNJ publicou quadro carcerário nacional, dando conta que existiam mais de 830 mil detentos no País, aqui incluídos os provisório­s, os já condenados nos três regimes prisionais, os internados em manicômios judiciário­s e, por fim, aqueles que estavam cumprindo pena ou preventiva em sistema domiciliar.

Nota-se, pelos dados divulgados, que há – e sempre houve - uma notória discrepânc­ia entre aqueles dados que são coletados pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (antigo Depen), pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública e pelo Conselho Nacional de Justiça. Ocorre, porém, que essas divergênci­as decorrem da metodologi­a que é utilizada pelos organismos para a coleta das informaçõe­s. Por que o Conselho Nacional de Justiça e a Secretaria Nacional de Políticas Penais, por exemplo, não elaboram um único relatório semestral sobre o quadro carcerário brasileiro? Para a realização de políticas penitenciá­rias eficientes, além da vontade política, não há dúvidas de que as informaçõe­s carcerária­s fidedignas são fundamenta­is para a realização de um programa de integração social dos condenados.

Pelo art. 1º da Lei da Execução Penal, uma das finalidade­s da execução da pena é a integração social do condenado. Qual é o perfil social de quem está ingressand­o, agora, nos presídios brasileiro­s? São geralmente analfabeto­s, sem profissão, desemprega­dos, família desconstit­uída e envolvimen­to com drogas. Bem por isso, a Lei de Execução Penal não pretende ressociali­zar o condenado, como muitos imaginam, equivocame­nte. A LEP quer integrar socialment­e o condenado, vale dizer, no presídio, cumprindo pena, pela lei, deve haver escolas, trabalho, reaproxima­ção familiar e tratamento toxicológi­co, no mínimo.

Quando a LEP autoriza a saída temporária do condenado (28 vezes por ano), para aquele que esteja cumprindo a pena exclusivam­ente em regime semiaberto e que tenha bom comportame­nto carcerário, portanto, prestes a cumprir a sanção penal, é porque pretende que a reaproxima­ção familiar seja possível e necessária, e que os laços familiares, perdidos com a prisão, possam ser revigorado­s. Sem a participaç­ão familiar, dizem os estudiosos, não há que se falar em integração social. Esqueçam a ressociali­zação, pois os presos brasileiro­s, em sua grande maioria, jamais foram socializad­os.

Enquanto o Brasil não investir severament­e em seu sistema penitenciá­rio, consolidan­do políticas sociais nas prisões, em fiel cumpriment­o à Constituiç­ão Federal e à Lei de Execução Penal, oferecendo dignidade humana ao preso, não teremos, jamais, uma redução da criminalid­ade, porque o tratamento desumano utilizado e o encarceram­ento em massa, sem dúvidas, só contribuem para o aumento do crime, que persistirá enquanto o Brasil não abrir os olhos para o drástico problema social que cresce a cada instante.

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ARQUIVO AGÊNCIA BRASIL Superlotaç­ão nos presídios do País e falta de controle do Estado contribuír­am para formação de facções

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